JOSÉ SÓCRATES DEMITE-SE NA VÉSPERA DA CIMEIRA EUROPEIA SOBRE ECONOMIA

Cavaco não aceitou a demissão de Sócrates obrigando-o assim a ir à Cimeira da UE

O primeiro-ministro José Sócrates apresentou ontem a demissão ao Presidente da República (http://www.youtube.com/watch?v=4YCs11D-hOs), uns minutos depois do debate na Assembleia da República em que foi chumbado o programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). «A oposição retirou todas as condições ao governo para governar. Por isso apresentei a minha demissão ao Presidente da República». Foi com esta declaração que Sócrates anunciou a sua demissão ao país, depois de a ter pedido a Cavaco Silva em Belém. Sócrates diz que tentou «proteger o país» para evitar «ajuda externa para que Portugal não ficasse na situação da Grécia e da Irlanda». «Um programa de ajuda externa tem consequências profundamente negativas para as famílias», defendeu o primeiro-ministro demissionário. Sócrates considera que os que acham que tiveram hoje uma «vitória política» têm «estreiteza de vista». «Hoje, o país perdeu, não ganhou. A irresponsabilidade triunfou sobre o sentido de Estado», disse. No entanto, ressalvou que «o país não ficou sem Governo. Os portugueses podem contar com um governo de gestão com a determinação de sempre».

Entretanto, o site da Presidência da República divulgou uma nota: «O Presidente da República recebeu hoje, em audiência, o primeiro-ministro, o qual lhe apresentou o seu pedido de demissão». A nota adianta ainda que o Governo mantém-se «na plenitude de funções até à aceitação daquele pedido». «Com vista à resolução da situação política decorrente do pedido de demissão do Primeiro-Ministro, o Presidente da República, nos termos constitucionais, irá promover, no próximo dia 25, audiências com os partidos representados na Assembleia da República», lê-se ainda na nota da Presidência da República. Nessa reunião, o chefe de Estado irá ouvir os partidos para tentar encontrar outra solução de Governo dentro do actual quadro parlamentar. Se não for possível a actual Assembleia da República gerar um novo Governo, como é previsível, o Presidente da República deverá então aceitar formalmente o pedido de demissão de José Sócrates e dar início ao processo de dissolução do Parlamento, ouvindo novamente os partidos e o Conselho de Estado. Numa declaração que se seguiu ao encontro com o Presidente da República, Sócrates foi claro ao dizer que a crise política só poderá ser resolvida pela «decisão soberana dos portugueses».

Também o líder do PSD, Pedro Passos Coelho, defendeu que será o caminho eleitoral que poderá permitir ao país ter um novo Governo «com mais força e mais determinação». Na mesma linha, o presidente do CDS-PP, Paulo Portas, defende que a democracia existe para resolver situações como a actual e até já fala em compromissos para a campanha eleitoral. O secretário-geral comunista, Jerónimo de Sousa, também pediu que seja devolvida a palavra aos portugueses e apelou a «uma mudança de política», afirmando que o PSD «concordava» com as propostas do Governo. Já o líder do Bloco de Esquerda, Francisco Louçã, rejeitou que o partido tenha aberto a porta a um Governo de direita, alegando que o país atingiu o «limiar da resistência», e afirmou que o seu partido quer vencer, além do PS, também o PSD.

Após o encontro com Cavaco Silva, que não durou mais do que 20 minutos, o primeiro-ministro responsabilizou a oposição - que acusou de ter feito uma "coligação negativa" - pela crise política, numa intervenção em que as primeiras palavras foram para admitir a possibilidade de Portugal ter de recorrer a ajuda externa. Dirigindo-se directamente aos portugueses, Sócrates falou várias vezes no risco de o país precisar de recorrer a ajuda externa. "Tenho lutado por proteger o país da necessidade de recorrer a ajuda externa. Sempre alertei para as consequências negativas de um programa de ajuda externa", disse o primeiro-ministro, sustentando que está em causa "a reputação nacional". Sócrates insistiu na ideia de que fez tudo para que houvesse um acordo com a oposição sobre o PEC e defendeu que, com a demissão do governo, o apoio que o país conseguiu do Banco Central Europeu e dos parceiros da zona euro foi "deitado por terra" por "calculismo político".