O Superjuiz Carlos Alexandre recusa destruir as escutas do Caso Face Oculta que tem em sua posse, nomeadamente as célebres escutas a José Sócrates e deu recado ao poder político sobre corrupção mantendo assim uma posição de força com o executivo, naquilo que considera ser justo fazer por uma Justiça séria e imparcial, separada do poder executivo. Entretanto, em pouco mais de cinco minutos, o Juíz Carlos Alexandre desfez todas as esperanças dos arguidos e dos advogados ontem presentes no Tribunal de Monsanto, para a leitura da decisão de pronúncia no processo conhecido como ‘Face Oculta’. "Remeto todos os arguidos para julgamento, mantendo a acusação", disse o superjuiz, garantindo que as únicas alterações ao despacho de ontem – relativamente ao que foi assinado pelos procuradores de Aveiro – são mesmo de redacção. "Tirei palavras como ‘urdida’ ou ‘estratagema’. É uma questão de estilo de escrita, mais nada", assegurou. Armando Vara e José Penedos são os réus mais mediáticos e viram o juiz validar as suspeitas de as suas actuações terem sido criminosas.
Armando Vara responde por três crimes de tráfico de influências, Penedos por dois de corrupção e dois de participação económica em negócio. "Mantive o estatuto processual de todos os arguidos, mesmo o de Manuel Godinho", explicou ainda o magistrado, garantindo que os pedidos do Ministério Público de que algumas medidas sejam agravadas terão de ser apreciados pelo juiz do julgamento. Na decisão de ontem, Carlos Alexandre pronunciou-se sobre todos os argumentos invocados pelos arguidos, destruindo-os um a um. Indeferiu também todas as nulidades, designadamente as que diziam respeito às escutas telefónicas. Relativamente a Vara, o juiz analisou os três crimes, sendo significativa a forma como confirmou as pressões para afastar Ana Paula Vitorino de secretária de Estado e Luís Pardal do Conselho de Administração da Refer. O objectivo, defendeu o Ministério Público, era beneficiar Godinho, que financiava o PS. "A expressão ‘empresa amiga do PS’ não tem outro entendimento que o de empresa que contribuiu ou se dispõe a contribuir para as campanhas do PS, não se apresentando como credível outro entendimento mais platónico", assegura Carlos Alexandre, que considera "sem credibilidade" o depoimento do ex-ministro Mário Lino.
Depois de terem sido fortemente criticados, designadamente ao serem acusados de transformar o processo num caso político, os três procuradores que ontem estiveram no Tribunal de Monsanto – João Melo, do DCIAP, João Marques Vidal, do DIAP de Aveiro, e Carlos Filipe, procurador-adjunto, também de Aveiro – saíram vitoriosos. Estiveram os três no tribunal a defender a acusação, e Carlos Alexandre deu-lhes ontem razão na forma como interpretaram os indícios. Recorde-se que Pinto Monteiro nomeou João Melo para dirigir a instrução, mas foi muitas vezes Marques Vidal quem, por conhecer o processo, fez os interrogatórios. À saída do tribunal, os três magistrados do Ministério Público, que chegaram juntos no carro mais antigo do parque automóvel, não prestaram quaisquer declarações. Cumprimentaram apenas advogados e arguidos. Eram 36 os arguidos, sendo que dois dos acusados eram as empresas de Manuel Godinho. O juiz entendeu que o despacho é validado integralmente, o que invalida a hipótese de recurso. O julgamento será em Aveiro. (in, Correio da Manhã Online). A lista de arguidos e respecivas acusações:
ARMANDO VARA: EX-ADMINISTRADOR DO BCP - 3 crimes de tráfico de influências, punidos pelo art.º 335.º. "Reunião com Godinho preparada através do telemóvel do Dr. Armando Vara que não estava sob escuta". (acórdão)
JOSÉ PENEDOS, EX-PRESIDENTE DA REN- 4 crimes, 2 de corrupção activa e 2 de participação económica. "Sempre se terá de concluir que prendas entre 330 e 1897,90 € nunca podem ser tidas como cortesia." (acórdão)
PAULO PENEDOS, ADVOGADO E FILHO DE JOSÉ PENEDOS - 1 crime de tráfico de influências, punido pelo art.º 335.º. "[José Penedos] comunicou-lhe informação privilegiada que Paulo Penedos traficou com Manuel Godinho." (acórdão)
MANUEL GODINHO, EMPRESÁRIO DE SUCATAS - 60 crimes de associação criminosa, corrupção e outros. "Godinho gizou um plano tendo por finalidade o favorecimento das empresas por si geridas." (acórdão)
LOPES BARREIRA, EX-ACCIONISTA DA CONSUGAL - 3 crimes de tráfico de influências, punidos pelo art. 335.º "Múltiplas as vezes em que Lopes Barreira invoca a sua influência e a coloca ao serviço de Godinho. (acórdão)
MANUEL GUIOMAR, QUADRO DA REFER - 10 crimes de corrupção activa, burla qualificada e falsificação
NAMÉRCIO CUNHA, COLABORADOR DE GODINHO - 2 crimes de associação criminosa e corrupção activa
JOÃO GODINHO, FILHO DE MANUEL GODINHO - 2 crimes de associação criminosa e corrupção activa
PAULO PEREIRA COSTA, FILHO DE MANUEL COSTA - 2 crimes de associação criminosa e receptação
ABÍLIO PINTO GUEDES, FERROVIÁRIO - 3 crimes de corrupção passiva para acto ilícito e burla qualificada
JOÃO VALENTE, ENGENHEIRO ELECTRÓNICO - 3 crimes de corrupção passiva, burla e falsificação de notação
CARLOS VASCONCELLOS, QUADRO DA REFER - 1 crime de corrupção passiva para acto considerado ilícito
ANDRÉ MANUEL OLIVEIRA, MILITAR DA GNR - 1 crime de corrupção passiva para acto considerado ilícito
JOSÉ MAGANO RODRIGUES, ENGENHEIRO CIVIL - 2 crimesde participação económica em negócio
RICARDO ANJOS, ASSISTENTE ADMINISTRATIVO - 1 crime de corrupção passiva para acto considerado ilícito
SILVA CORREIA, ENGENHEIRO CIVIL REFORMADO - 5 crimes de associação criminosa e participação em negócio
VICTOR BAPTISTA, DIRECTOR-GERAL DA REN - 5 crimes de corrupção activa e participação em negócio
FERNANDO SANTO, ADMINISTRADOR DA REN - 4 crimes de abuso de poder e participação em negócio
JUAN OLIVEIRA, ENGENHEIRO DA REN - 3 crimes de corrupção passiva e participação em negócio
PEDRO LARANJEIRA, FUNCIONÁRIO DA O2 - 2 crimes de burla qualificada e falsificação de notação técnica
JORGE SARAMAGO, FUNCIONÁRIO DE GODINHO - 2 crimes de burla qualificada e falsificação de notação técnica
MARIBEL RODRIGUES, FUNCIONÁRIA DE GODINHO - 3 crimes de associação criminosa, burla qualificada e outro
JOSÉ LOPES VALENTIM, QUADRO DA REFER - 2 crimes de associação criminosa e corrupção passiva
PAIVA NUNES, ADMINISTRADOR DA EDP IMOBILIÁRIA - 3 crimes de corrupção activa e participação em negócio
ANTÓNIO PAULO COSTA, QUADRO DA GALP - 2 crimes de corrupção passiva e tráfico de influências
JOSÉ CONTRADANÇAS, ADMINISTRADOR DA IDD - 1 crime de corrupção passiva para acto considerado ilícito
JOSÉ SANTOS CUNHA, ENGENHEIRO - 1 crime de corrupção passiva para acto considerado ilícito
ROGÉRIO NOGUEIRA, TÉCNICO DE PRODUÇÃO - 2 crimes de corrupção passiva para acto ilícito e furto qualificado
JOÃO TAVARES, GESTOR DE STOCKS DA GALP - 2 crimes de corrupção passiva no sector privado e burla
MÁRIO PINHO, CHEFE DE REPARTIÇÃO DE FINANÇAS - 2 crimes de associação criminosa e corrupção passiva
HUGO GODINHO, SOBRINHO DE MANUEL GODINHO - 7 crimes de associação criminosa, furto, burla e corrupção
MANUEL NOGUEIRA DA COSTA, SUCATEIRO - 9 crimes de associação criminosa e receptação
MANUEL GOMES, FUNCIONÁRIO DA LISNAVE - 3 crimes de corrupção passiva para acto ilícito e burla qualificada
FIGUEIREDO COSTA, FUNCIONÁRIO DA LISNAVE - 3 crimes de corrupção passiva para acto ilícito e burla qualificada
O2, EMPRESA DO ARGUIDO MANUEL GODINHO - 23 crimes de corrupção, falsificação, burla e outros
SCI, EMPRESA DO ARGUIDO MANUEL GODINHO - 7 crimes de burla qualificada e falsificação de notação técnica.