António Nunes Coelho, 49 anos, vítima de ataque cardíaco depois de cair de andaime foi abandonado por estar ilegal
António Nunes Coelho, de 49 anos, ainda esteve vivo “entre 15 minutos a uma hora” depois de ter sido despejado pelo patrão e dois colegas da obra, numa ruela deserta de Bruxelas, onde estava a trabalhar ilegalmente. Depois de ter caído de um andaime, vítima de um ataque cardíaco, em vez de ser socorrido foi transportado de camião e abandonado num local deserto. As autoridades belgas investigaram o caso e a autópsia concluiu que o português foi abandonado ainda com vida, noticiou na terça-feira o jornal belga La Dernière Heure. O emigrante português, que vivia há 12 anos na Bélgica em situação legal, tinha sido despedido da empresa de construção belga Cassal há cerca de dois anos. Como não encontrava trabalho decidiu aceitar o que seria apenas um pequeno biscate não declarado como estucador, três dias por 500 euros.
Levantou-se às cinco da manhã, entrou às 6h e, ao final da manhã, caiu de um andaime vítima de um ataque cardíaco. No estaleiro gerou-se o pânico e o responsável logo chegou para tratar do assunto, noticiou a imprensa. Só que o patrão, em vez de pedir socorro, chamou dois funcionários para ajudarem a transportar o homem para um camião. Depois de uma viagem de duas horas abandonaram o corpo numa ruela deserta de um parque de Bruxelas. De regresso ao trabalho, retomaram a obra.
A imprensa noticiou o que se passou este mês, mas o corpo já foi encontrado a 12 de Novembro, por um transeunte.
O facto de ser sábado, um fim-de-semana prolongado, e o cadáver estar com roupas de trabalho sujas de tinta e gesso levantou as suspeitas da polícia que, depois de dois meses de investigação, localizou o estaleiro onde tudo se passou, da empresa EG-Batineuf. Foi aberto um inquérito por falta de assistência a pessoa em perigo, ocultação da cadáver. Estão em causa várias infracções laborais, como trabalho não declarado, ausência de documentação social, condições que colocam em perigo a segurança e a saúde dos trabalhadores. Segundo o site informativo Lusófonos na Bélgica o patrão já tinha sido condenado em 2011 por empregar mão-de-obra clandestina. O patrão da obra não só abandonou o operário como, nessa mesma noite, mandou um empregado pressionar a viúva, Lurdes Nunes, para que nada revelasse, oferecendo-lhe 10 mil euros para não ir à polícia, “e mais algum de tempos a tempos”. Lurdes, que vive em Bruxelas com 700 euros por mês, recusou a proposta diz o mesmo jornal. “Nunca iria aceitar aquele dinheiro sujo. Estou muito satisfeita com o trabalho da polícia.
Deixaram-no morrer e desfizeram-se dele como se fosse um cão”, afirmou ao La Dernière Heure, no início de Fevereiro. O português, natural de Ervedal (concelho alentejano de Avis) tinha pendente no Tribunal de Trabalho de Bruxelas um processo por despedimento abusivo. O irónico é que depois da sua morte se soube que a justiça lhe tinha dado razão, condenando a empresa a pagar-lhe 14 mil euros, a empresa recorreu. Segundo declarações de Rik Desmet, sindicalista da Federação Geral de construção FGTB, citado pelo site Lusófonos na Bélgica, o trabalho ilegal no país está a crescer: "Três quartos destas pessoas são originários de países lusófonos (portugueses, brasileiros, cabo-verdianos e angolanos). É muito difícil controlar este circuitos de tráfico humano, dado que eles trabalham em muitos locais diferentes. A construção é um sector onde os acidentes ocorrem com frequência. Se um trabalhador ilegal na construção tem um acidente, geralmente os chefes não sabem o que fazer temendo as multas".