CONDOMÍNIO ALCÂNTARA RESIDENCE APROPRIOU-SE DE 12.310 M2 DE ESPAÇO PÚBLICO

cedência à CML de 12.310 m2 não passou de bluff, enquanto João Soares era presidente

As oliveiras abundam, são das antigas e frondosas, e o povo de Alcântara já lhes chamou suas. Foi ali por 1975, quando a revolução entrou pela enorme tapada da família Melo, entre a rua dos Lusíadas e a Primeiro de Maio, mesmo por baixo do tabuleiro da ponte 25 de Abril. Actualmente os mais de dois hectares da propriedade onde o grupo Temple e o fundo de investimento GEF, do empresário Vasco Pereira Coutinho, construíram, entre 1999 e 2001, o condomínio de luxo Alcântara Residence, estão separados do público por uma cancela vigiada, apesar de conter arruamentos públicos. Com uma única entrada através da arcada existente sob o número 120 da Rua Luís de Camões, o espaço da antiga tapada, completamente cercado pelos edifícios das ruas limítrofes, foi dividido em 18 lotes e tem agora outros tantos prédios com mais de uma centena de casas. "Isto é uma vergonha, as ruas são todas da câmara, mas só quem lá mora é que pode entrar", critica um vizinho que já ouviu quem sabe mais do que ele sobre o caso.
"As fracções foram publicitadas e vendidas como um condomínio fechado e essa é que é a génese do problema", diz Miguel Sá Monteiro, um dos administradores do condomínio que gere a urbanização e que não nega a natureza pública dos espaços interiores. O site da Temple, porém, ainda apresenta o Alcântara Residence como um "condomínio residencial fechado". Sá Monteiro não hesita: "Fomos enganados." Por isso mesmo, acrescenta, há muitos processos a correr contra os promotores nos tribunais. Quanto ao essencial, garante, "a solução do problema já foi negociada com o vice-presidente da Câmara [arquitecto Manuel Salgado] e está prestes a ser formalizada". Mas, afinal qual é o problema? A resposta está no alvará de loteamento emitido em 1997 pela Câmara de Lisboa, ao tempo em que João Soares era seu presidente. Entre as condições estabelecidas para autorizar a construção dos edifícios estava a cedência pelo promotor à autarquia, obrigatória por lei, de um total de "12.310 m2, destinados a infra-estruturas, estacionamento e espaços verdes", que foram integrados no domínio público municipal por escritura notarial. Como resulta inequivocamente da lei, tais espaços "não são susceptíveis de qualquer apropriação particular" e a limitação do acesso dos cidadãos em geral aos mesmos é proibida. Acresce que o alvará diz também que foi "garantida a passagem pública a peões e veículos à superfície". Manuel Salgado e Sá Fernandes (responsável pelo espaço público), também contactados pela imprensa, nada quiseram comentar. (in, Jornal Público).